Em meu último artigo para o blog, falei sobre como é importante reconhecermos que nossa profissão ainda não criou um material superior ao dente. Com essa percepção, é possível adotar, sempre que possível, medidas minimamente ou não invasivas, em nossos tratamentos.
Um dos mitos que a Odontologia criou foi a de “restaurações definitiva”, que consiste na última coroa, faceta, etc. Em minha opinião, esse fato não existe! Portanto, o que está em nosso alcance é ter como objetivo uma restauração mais duradoura possível.
Resinas compostas x Amálgama de prata
Atualmente, as resinas compostas são um dos materiais diretos mais utilizados no mundo. Criadas ao redor de 1955, tornaram-se mais populares na América Latina no final dos anos 1980. Só dez anos depois, passaram a substituir as restaurações de amálgama de prata que, até então, era o mais utilizado, sobretudo em dentes posteriores.
Uma das principais vantagens do amálgama de prata é a facilidade com que se realiza uma restauração. É um material tão simples de trabalhar que nem necessita de um dentista. Aliás, já é conhecido há mais de 300 anos, ou seja, quase três vezes a idade de nossa profissão. Outra vantagem é sua durabilidade, que é fácil de explicar devido a sua micro expansão e sua necessidade de cavidades extensas.
Sobretudo esse também é seu maior defeito: a exigência de remoção de tanto tecido sadio. Quantas fraturas de cúspide ou fraturas coronárias poderiam ter sido evitadas com materiais sem essas características?
Muitas das cavidades para resinas compostas podem ser menores que as cavidades requeridas para restaurações de amálgama. Vale notar que as resinas tornaram-se muito populares por suas características estéticas, e menos por suas características de mínima invasão. Ainda assim, é uma conquista da Odontologia ter um material que permita a preservação de mais estrutura dental. A má notícia no caso das restaurações de resinas fica por conta de sua confecção. É um material muito mais exigente que seu antecessor, o amálgama de prata.
Desafios das restaurações diretas de resina composta
Em suma, hoje em dia se faz muito menos restaurações metálicas diretas do que resinas compostas, principalmente em consultórios privados. De acordo com alguns estudos, 40% das restaurações de resina composta com mais de 10 anos apresentam semelhanças com as piores restaurações de amálgama. Em outras palavras, trocamos de material restaurador, passando a utilizar um que é mais conservador e estético. Porém, este material não permanece nem a metade do tempo que o material anterior ficaria na cavidade oral.
A primeira tentação odontológica é jogar a culpa sobre o material ou sobre a técnica adesiva. Não há dúvida de que são mais que importantes e fundamentais. Entretanto, há um outro fator que talvez esteja sendo desprezado: a técnica de fotopolimerização.
Perda de brilho superficial, micro-infiltrações, fraturas e delaminações normalmente estão relacionadas com uma fotopolimerização deficiente. Um dos problemas disso é que a diferença clínica entre uma restauração bem fotopolimerizada e uma mal fotocurada é imperceptível ao olho nu. Ao contrário de ambientes laboratoriais, onde é possível distinguir uma da outra facilmente, na cavidade oral necessitamos de tempo, e a percepção em geral se dá apenas quando é tarde demais, devido à falha da restauração.
>>>Leia mais: Dicas para evitar a infiltração marginal em resina composta
Fotopolimerização: muito mais do que apertar um botão.
O processo de fotopolimerização nada tem de novo na Odontologia. O que é novo é o conhecimento mais técnico de nossa parte. Hoje, sabemos que muitas das lâmpadas halógenas necessitam mais do que 90 segundos para que consigam polimerizar corretamente nas regiões mais profundas de restaurações classe II. Surpreendentemente, pouquíssimos profissionais passaram esse tempo iluminando restaurações dessa categoria na década passada.
>>>Leia mais: Como fazer o seu fotopolimerizador durar mais?
E hoje, com as novas lâmpadas de tecnologia LED, quanto tempo é realmente necessário?
Na verdade, é até desleal e injusto que as companhias fabricantes dos materiais tenham que responder a esta pergunta. Como é possível saber essa informação se não fazem ideia de que tipo de lâmpada os dentistas possuem? Com tantas diferenças entre os aparelhos, sendo uns mais potentes, outros menos, uns mais colimados, outros menos, fica claro que é impossível entregar uma resposta precisa. O que resta aos fabricantes de resina é supor!
Eles imaginam que o dentista tenha pelo menos uma lâmpada com uma irradiância (ou potência por uma determinada área) de 800mW/cm 2. Sendo capaz de transmitir em 20 segundos os 16J/cm 2 aceitos hoje em dia para polimerizar a maioria das resinas.
Entretanto, que a lâmpada seja capaz de produzir energia é uma coisa. Transmitir, enviar essa potência até a resina é um outro problema. No caso onde exista distância entre a ponta do fotopolimerizador e o fundo da cavidade, em especial nos casos de restaurações classe II.
Aí entra a importância da colimação, ou seja, de que luz seja produzida e condensada em uma mesma área. Este é um tema sobre o qual já escrevi em um capítulo no livro do prof. Ewerton Nocchi, e que merece retornar futuramente a este espaço. Como profissionais da saúde, é fundamental que saibamos não apenas executar, mas antes de tudo indicar as melhores técnicas e materiais. E que não culpemos mais os materiais por suas deficiências. Ao contrário, que saibamos mais suas características, exigências, fragilidades e vantagens.
Sobre o autor:
Dr. Rafael S. Beolchi
- Atua em consultório particular desde 2001 na área de odontologia estética.
- Mestrado em Biomateriais pela USP.
- Professor responsável por Cursos de Atualização em Estética com Resinas Compostas
- Diretas em institutos nacionais e internacionais.
- Pesquisador associado do departamento de Dentística da Universidade de São Paulo.
E você, utiliza amálgama em seu consultório hoje em dia?
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